A falar de flexibilidade laboral: período de trabalho irregular

Neste post, eu gostaria de abordar a distribuição irregular do período de trabalho, como uma forma de organizar a jornada e que pode afetar o registo dos tempos de trabalho exigido pela Lei.



O que é a distribuição irregular do período normal de trabalho?



A distribuição irregular da jornada de trabalho, na Espanha, regulamentada no Artigo 34.2 do Decreto Real Legislativo 2/2015, de 23 de Outubro, que aprova o texto revisto da Lei do Estatuto dos Trabalhadores, é uma medida que permite permite tornar a jornada de trabalho mais flexível às necessidades de trabalho existentes a qualquer momento na empresa, aumentando o tempo de trabalho em períodos de pico de produção ou de trabalho, com redução compensatória em outros períodos de menor volume ou diminuição da produção.

Em Portugal, a distribuição do tempo de trabalho, está regulamentada no Artigo 197.º da Lei n.º 7/2009 do Código do Trabalho e ao contrário da espanhola, não permite tornar a jornada laboral mais flexível, ao invés disso, permite a Adaptabilidade por regulamentação coletiva, individual e grupal, estabelicidos nos Artigos 204.º, 205.º e 206.º da Lei n.º 7/2009 do Código do Trabalho.





Não implica que a empresa possa modificar os dias estabelecidos no calendário de trabalho como dias úteis ou dias não úteis, nem o número total de horas anuais a realizar, apenas se pode modificar a distribuição horária mensal, semanal ou diária. (Acórdão TSJ Castilha e León (Burgos), Sala Social, nº 347/2013, de 17/07/2013, Rec. 351/2013).



Que requisitos tenho de cumprir para distribuir irregularmente os horários de trabalho dos trabalhadores?



1. DISTRIBUIÇÃO





A distribuição irregular da jornada de trabalho ao longo do ano pode ser estabelecida por negociação coletiva ou, na sua falta, por acordo entre a empresa e os representantes dos trabalhadores. Na falta de acordo, a sociedade pode distribuir irregularmente 10% da jornada laboral ao longo do ano.



2. LIMITES





Deve respeitar os períodos mínimos de descanso diário e semanal previstos por Lei:

➜ Descanso diário: O número de horas normais de trabalho efetivo não pode exceder nove por dia, salvo acordo coletivo ou, na sua falta, acordo entre a empresa e os representantes dos trabalhadores, se for estabelecida outra repartição do tempo de trabalho diário, respeitando, em qualquer caso, o descanso entre os dias. Além disso, devem decorrer pelo menos doze horas entre o final de um dia útil e o início do dia seguinte

➜ Descanso semanal: Os trabalhadores têm direito a um período mínimo de descanso semanal, acumulável por períodos que podem ir até catorze dias, um dia e meio ininterruptos, que compreende, regra geral, o sábado à tarde ou, conforme o caso, a manhã de segunda-feira e todo o dia de domingo.



3. PRÉ-AVISO





Como requisito formal, o empregador deve notificar os trabalhadores afetados do dia e hora do trabalho irregularmente distribuído, com pelo menos 5 dias de antecedência.



4. COMPENSAÇÃO





Por outro lado, a compensação das diferenças entre a jornada de trabalho realizada e a duração máxima da jornada normal de trabalho, legal ou acordada, seja por excesso ou defeito, deve ser feita, conforme acordado na negociação coletiva ou entre a empresa e os representantes dos trabalhadores.

Na falta de acordo, tais diferenças devem ser compensadas no prazo de doze meses a contar da data da sua ocorrência e o artigo acima referido não estabelece que devam ser compensadas no decurso do ano civil.



Considerações



Tendo em conta o que precede, em determinadas ocasiões não será considerado como horas extraordinárias o número de horas trabalhadas para além do horário normal de trabalho, desde que se faça uso do poder de distribuição irregular do dia útil e num cálculo de doze meses, e que, a partir do momento em que ocorram, a convenção coletiva para a jornada anual ou a duração máxima da jornada normal de trabalho, não exceda 40 horas por semana de trabalho efetivo num cálculo anual.





Saliente-se que, por meio de uma Convenção Coletiva ou por acordo entre a empresa e os representantes legais dos trabalhadores, pode ser acordada a distribuição irregular da jornada de trabalho e suas condições, configurando-se como uma ferramenta organizacional interna, podendo estabelecer uma série de limites ligados, por exemplo, à existência de causas produtivas, à exigência de aviso prévio superior, a compensações de descanso superiores ao tempo de trabalho ou ao estabelecimento de um complemento retributivo, como forma de limitar os efeitos negativos que a distribuição irregular possa ter sobre as condições de trabalho do pessoal.





A este respeito, a jurisprudência foi pronunciada tendo em conta que os trabalhadores que têm uma jornada de trabalho reduzida devido à tutela legal de uma criança com menos de doze anos de idade ou de uma pessoa com deficiência mental, física ou sensorial, que não tem atividade remunerada ou cuidado de um membro da família, e outros trabalhadores que beneficiam de uma autorização para conciliar a vida profissional e familiar, salvo acordo com eles, não podem ser afetados (Acórdãos do Supremo Tribunal, Câmara Social, de 13/03/2014, Rec. 80/201 e TSJ Andaluzia (Sevilha), Sala do Social, nº 2970/2012, de 25/10/2012, Rec. 519/2011).



Qual é o CRITÉRIO DA INSPEÇÃO DE TRABALHO E SEGURANÇA SOCIAL?



Tendo em vista a entrada em vigor da obrigação de registo da jornada de trabalho (art. 10.º do Real Decreto-Lei n.º 8/2019, de 8 de Março, sobre medidas urgentes de proteção social e combate ao trabalho precário na jornada laboral), a Inspeção do Trabalho estabeleceu no Critério Técnico 101/2019 sobre a atuação da Inspeção de Trabalho e Segurança Social em matéria de registo da jornada de trabalho, que deve ter-se presente que o registo da jornada de trabalho está configurado:

“sem prejuízo da flexilbilidade prevista no Artigo 34.2 e 34.3 do E.T.”





Isto implica que a leitura do registo, ao determinar o possível incumprimento de determinados limites ao tempo de trabalho, deve ser feita de forma abrangente, considerando todas as possibilidades permitidas pelo sistema laboral em termos de distribuição do tempo de trabalho.

Por todas estas razões, é conveniente que o registo utilizado na empresa seja objetivo e fiável, oferecendo uma visão adequada e completa do tempo de trabalho efetivo.

Para isso, é necessário que o sistema inclua interrupções ou pausas não consideradas trabalho efetivo na jornada de trabalho diária, desde que o registo inclua necessariamente as horas de início e de fim da jornada de trabalho. Caso contrário, pode presumir-se que uma jornada de trabalho efetiva é qualquer jornada que ocorra desde o início e o fim da jornada de trabalho registada.

Artigo original publicado no Blog da MHP Espanha.